Rupee completa 75 anos como símbolo da Índia independente e revela uma jornada de 500 anos que atravessa impérios, mares e moedas
A Índia celebra em 2025 os 75 anos de sua moeda como emblema da República. A data marca a entrada do país no clube das nações soberanas e resgata uma história muito mais longa. O nome Rupiya surgiu no século 16 e acabou moldando sistemas comerciais da África ao Sudeste Asiático. Para contar essa travessia, a Sarmaya Arts Foundation abriu em Mumbai a exposição Odyssey of the Rupee, que reconstrói a evolução da moeda desde os primeiros discos de prata de Sher Shah Suri até as notas atuais.
A mostra ocupa o histórico prédio Lawrence & Mayo, no bairro de Fort, entre o Banco Central e a Casa da Moeda. O local reforça o clima de viagem no tempo: vitrines com moedas antigas, mapas, notas estrangeiras e objetos que explicam como a moeda indiana circulou por portos, caravanas e impérios.
A narrativa começa em 1540, quando Sher Shah Suri implantou um sistema simples e eficiente. Ele criou três unidades: o mohur de ouro, o rupiya de prata e o dam de cobre. O rupiya tinha cerca de 11,5 g de prata e virou padrão. O dam, tão leve quanto o valor que carregava, deu origem à expressão inglesa “I don’t give a damn”. As inscrições das moedas traziam versos religiosos e, em muitos casos, nomes gravados em árabe e devanágari. Essa combinação mostrava que a moeda servia tanto para pagar impostos quanto para afirmar autoridade sobre um território diverso.
O sistema resistiu até a ascensão do Império Mughal. Akbar, um dos governantes mais influentes da dinastia, manteve o padrão de pesos e registrou as regras da moeda no Ain-i-Akbari, documento que se tornou base administrativa do período. Com isso, o rupiya ganhou estabilidade que permitiu seu uso em rotas comerciais de longa distância.
A partir daí, a história deixa de ser apenas indiana. Na época, o Oceano Índico funcionava como uma rede intensa de troca de roupas, contas, madeira, especiarias e metais. A moeda indiana entrou nessa engrenagem. Ela conviveu com o dinar árabe e com moedas europeias, disputando espaço com o popular dólar Maria Theresa. O rupiya se espalhou por portos da África Oriental, ganhou força em Java e alcançou Arábia e Golfo. Em 1906, era usado no Quênia e na Tanzânia. No Golfo, seguiu como moeda corrente até meados dos anos 1960.
A influência cultural também perdurou. O rupiya virou Rupiah na Indonésia e Rufiyaa nas Maldivas, mostrando que o nome da moeda atravessou fronteiras junto com mercadores e marinheiros.
A exposição exibe notas e moedas desses países para mostrar essa expansão. Há exemplares vindos de Moçambique, Java e Arábia Saudita, cada um com traços de quem o usou e por quanto tempo circulou. A seleção reforça o que a mostra tenta dizer: a moeda não ficou limitada à Índia. Ela abriu portas e fez parte de redes que misturavam economias, religiões e línguas.
A virada para a soberania política veio só no século 20. A Independência chegou em 1947, mas a ruptura monetária demorou alguns anos. A Índia manteve o sistema britânico na fase conhecida como Frozen Series. O país só adotou sua primeira moeda própria em 1950. A mudança é fácil de identificar. Sai o rosto do rei George VI e entra o Leão de Ashoka, símbolo da República. No verso, o tigre do período colonial dá lugar a uma espiga de milho, imagem ligada à produção agrícola.
A década seguinte trouxe outra transformação. Em 1957, o país adotou o sistema decimal. Surgiu o “Naya Paisa”, o novo paisa, que depois perdeu o adjetivo e ficou só “paisa”. A transição, feita de forma gradual, simplificou contas, padronizou valores e aproximou o sistema indiano dos modelos internacionais.
O responsável por organizar esse amplo percurso histórico na exposição é o pesquisador Shailendra Bhandare, do Ashmolean Museum, em Oxford. Ele estuda moedas do Sul da Ásia há décadas. Na mostra de Mumbai, ele costura os períodos de forma visual e direta: da prata de Sher Shah às moedas do período pós-Independência, passando por peças usadas em portos distantes do subcontinente.
O objetivo da mostra é simples: mostrar ao visitante que uma moeda guarda muito mais do que números. Ela traz rastros de quem governou, de quem comerciou, de quem viajou e de quem se libertou. A história do rupee acompanha conquistas, derrotas e decisões políticas. E, 75 anos após se tornar moeda da República, o rupee segue como memória viva do caminho que a Índia percorreu.